Diácono Francisco Artur Pinheiro Alves
Nesta crônica eu abordo
a questão da água na Carqueija dos Alves, tendo como base o período da minha vida, que
vivenciei esta problemática. É um pouco o resgate da memória do trabalho
informal, mas nem por isso menos importante, a memória das e dos botadores de água. Carregar
água, como se dizia, era uma tarefa muito cansativa, mas tinha seus momentos
lúdicos. Na beira do açude ou do cacimbão, se conversava, contava-se histórias,
batia-se um papo, meio rápido, por ser só momento de chegada, carregamento dos
utensílio e saída, mas era sim um momento de alegria, de confraternização, por
isso classifiquei como momento lúdico.
Dentro do
propósito deste livro, que e resgatar a história e a memória de nossa
comunidade trago estes dois reservatórios hídricos o Açude das Peixotas e o
Cacimbão de São Francisco, hoje
desativados, para que renovemos a sua memória.
1. 1. O Açude das Peixotas
O
Açude das Peixotas fica situado às margens da estrada que liga a Carqueija São
Mateus à Carqueija dos Alves, no lado esquerdo da via, no sentido daquela para
esta.
No
tempo que não havia poço, nem água encanada na região, ainda não há na
Carqueija dos Alves, mas há poços. Naquele tempo se buscava água na cabeça e no
lombo de jumentos.
Então,
até a década de 1990, o açude das Peixotas era a Caixa d’água da região. O
último a secar e o da água de melhor qualidade. Isso por que tem na sua vazante
uma belíssima serra coberta de mata do semiárido, que, suponho, garante a
qualidade da sua água.
Segundo
o meu irmão Pedro Jorge, o açude teria sido construído ou concluído em 1875,
período de seguidas secas no Ceará. Não se tem documento sobre isso, mas com
certeza teria sido ainda no Século XIX.
Sendo
ali uma propriedade da família Peixoto, recebeu o nome da família. Está escrito
no singular, por que flexiona com o nome da
líder da família, a matriarca, dona Maria Peixoto.
Este
açude, hoje associado e com sua parede arrombada (a prefeitura nunca ligou em
consertá-lo), abasteceu, muitas vezes a Carqueija dos Alves e a Carqueija São
Mateus, segurando o fornecimento de água até a chegada do inverno.
Nós
tempos de seca, ele secava e só recebia carga no inverno seguinte. Quando já
estava só no porão, papai autorizava pescar. Vinha muita gente, os pescadores e
os curiosos. Pegava-se muita traíra, sovelas e carás. Muitas vezes, também muçu
ou muçum. Estes, mais espertos, fincavam-se na lama.Depois do açude seco a
gente cavava e encontrava muçus na lama e, gordos.
Outro
destaque que quero registrar falando deste maravilhosos açudinho, é a
participação de outro aliado do homem do nordeste brasileiro, até a popularização
das motocicletas e dos transportes em geral, do jumentos. A maioria do
transporte de água era no lombo de jumentos que levava 4 latas ou 4 canecas d’água,
o que correspondia a aproximadamente, 89 litros por caminhada. Eu mesmo
carreguei muita água de jumento.
Por
último quero registrar outro fato importante. Primeiro na margem esquerda do
açude minha mãe sempre plantava um canteiro de coentro e cebola, dava o verão
inteiro. Nas vazantes do açude, muitas vezes se plantava feijão ou batata.
Houve um ano que o papai plantou tomate e eu aguava todas as tardes. A medida
que o açude ia secando, ia-se plantando e tinha-se feijão verde para o consumo
de pelo menos uma vez por semana, ali pelos.meaes.de novembro e dezembro, coisa
rara na região. Quando não acontecia de um jumento entrar no roçado e comer as
verdes folhas e ramas da plantação, o que não era raro, dada a fragilidade das cercas.
Viva o
Açude das Peixotas, um dos ícones da Carqueija dos Alves.
Escrito ao amanhecer do dia 8
de março de 2023, na Carqueija dos Alves
2. 2. O Cacimbão de São Francisco.
Na
extrema do terreno do vovô com o da Diocese, hoje do Zé Daniel e familiares,
tem um cacimbão, que hoje está com anéis, mas nem sempre foi assim.
Este
cacimbão tem uma relação muito íntima com as famílias da Carqueija, tanto da
Carqueija dos Alves, como a Carqueija Diocese e a Carqueija São Mateus. Isso
porque socorreu as famílias locais nos períodos de estiagem. E foram muitos.
Segundo
apuramos este cacimbão teria sido marcado, indicado por um padre. Uns dizem que
foi o Pe. Cícero São Cícero de Juazeiro outros não chegam a afirmar que padre
foi. Como o proprietário do local era uma pessoa muito católica, o Sr. Pierre
Aon, de quem já falamos em outros trabalhos, é razoável acreditar que tenha
sido realmente a indicação de um padre pois muitos deles tinham conhecimento de
hidrologia e geologia geografia, o que certamente influenciou nesta indicação. Mas,
seja como for o importante é registrar a importância do cacimbão de São
Francisco para toda essa gente.
Segundo
o meu irmão Sassá, que botou muita água de lá em 1958, ano de uma grande seca,
a pessoa que cuidava do Cacimbão, Sr. Antônio Terto, que morava bem pertinho do
mesmo, cuidava com todo carinho do Cacimbão. Tinha um flandre e uma vassoura de
relógio (mato que se faz vassoura de terreiro) e todas as tardes ele limpava as
fezes dos jumentos que as pessoas traziam para levar água.
O
Cacimbão era aberto, tinha uma escadaria que a gente descia até embaixo, para
colher a água. Ainda segundo segundo Sassá, o local da água era uma área de uns
três metros, dentro da pedra. Tinha umas duas veias d'água, que jorravam água
até o nível do lençol freático. Quando tinha muita gente tirando água, nos
períodos de seca, faltava água, por alguns minutos, as pessoas esperavam que acumulasse um volume
suficiente para se encher uma cuia e encher os recipientes: latas de querosene,
latas de banha, cabaças canecas de madeira, potes pequenos e outros utensílios
par colheita da água.
Anos
atrás foi feita uma reforma no Cacimbão, foram colocados anéis e fechado a
parte das escadarias do seu entorno. Mas até hoje continua com muita água, o
que mostra que quem marcou o local daquele Cacimbão, tinha muita experiência
neste ofício.
Viva o
Cacimbão de São Francisco, que beneficiou tantas famílias e animais, nos
momentos mais difíceis de suas vidas, nos períodos de seca.
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