sábado, 18 de março de 2023

AÇUDE DAS PEIXOTAS E CACIMBÃO SÃO FRANCISCO: dois importantes reservatórios hídricos da Carqueija dos Alves e suas histórias.

 Diácono Francisco Artur Pinheiro Alves

Nesta crônica eu abordo a questão da água na Carqueija dos Alves, tendo como base o período da minha vida, que vivenciei esta problemática. É um pouco o resgate da memória do trabalho informal, mas nem por isso menos importante, a memória das e dos botadores de água. Carregar água, como se dizia, era uma tarefa muito cansativa, mas tinha seus momentos lúdicos. Na beira do açude ou do cacimbão, se conversava, contava-se histórias, batia-se um papo, meio rápido, por ser só momento de chegada, carregamento dos utensílio e saída, mas era sim um momento de alegria, de confraternização, por isso classifiquei como momento lúdico.

             Dentro do propósito deste livro, que e resgatar a história e a memória de nossa comunidade trago estes dois reservatórios hídricos o Açude das Peixotas e o Cacimbão de São Francisco,  hoje desativados, para que renovemos a sua memória.

 

1.    1. O Açude das Peixotas

O Açude das Peixotas fica situado às margens da estrada que liga a Carqueija São Mateus à Carqueija dos Alves, no lado esquerdo da via, no sentido daquela para esta.

No tempo que não havia poço, nem água encanada na região, ainda não há na Carqueija dos Alves, mas há poços. Naquele tempo se buscava água na cabeça e no lombo de jumentos.

Então, até a década de 1990, o açude das Peixotas era a Caixa d’água da região. O último a secar e o da água de melhor qualidade. Isso por que tem na sua vazante uma belíssima serra coberta de mata do semiárido, que, suponho, garante a qualidade da sua água.

Segundo o meu irmão Pedro Jorge, o açude teria sido construído ou concluído em 1875, período de seguidas secas no Ceará. Não se tem documento sobre isso, mas com certeza teria sido ainda no Século XIX.

Sendo ali uma propriedade da família Peixoto, recebeu o nome da família. Está escrito no singular, por que flexiona com o nome da   líder da família, a matriarca, dona Maria Peixoto.

Este açude, hoje associado e com sua parede arrombada (a prefeitura nunca ligou em consertá-lo), abasteceu, muitas vezes a Carqueija dos Alves e a Carqueija São Mateus, segurando o fornecimento de água até a chegada do inverno.

Nós tempos de seca, ele secava e só recebia carga no inverno seguinte. Quando já estava só no porão, papai autorizava pescar. Vinha muita gente, os pescadores e os curiosos. Pegava-se muita traíra, sovelas e carás. Muitas vezes, também muçu ou muçum. Estes, mais espertos, fincavam-se na lama.Depois do açude seco a gente cavava e encontrava muçus na lama e, gordos.

Outro destaque que quero registrar falando deste maravilhosos açudinho, é a participação de outro aliado do homem do nordeste brasileiro, até a popularização das motocicletas e dos transportes em geral, do jumentos. A maioria do transporte de água era no lombo de jumentos que levava 4 latas ou 4 canecas d’água, o que correspondia a aproximadamente, 89 litros por caminhada. Eu mesmo carreguei muita água de jumento.

Por último quero registrar outro fato importante. Primeiro na margem esquerda do açude minha mãe sempre plantava um canteiro de coentro e cebola, dava o verão inteiro. Nas vazantes do açude, muitas vezes se plantava feijão ou batata. Houve um ano que o papai plantou tomate e eu aguava todas as tardes. A medida que o açude ia secando, ia-se plantando e tinha-se feijão verde para o consumo de pelo menos uma vez por semana, ali pelos.meaes.de novembro e dezembro, coisa rara na região. Quando não acontecia de um jumento entrar no roçado e comer as verdes folhas e ramas da plantação, o que não era raro, dada a fragilidade das cercas.

Viva o Açude das Peixotas, um dos ícones da Carqueija dos Alves.

 

Escrito ao amanhecer do dia 8 de março de 2023, na Carqueija dos Alves

 

2.    2. O Cacimbão de São Francisco.

 

Na extrema do terreno do vovô com o da Diocese, hoje do Zé Daniel e familiares, tem um cacimbão, que hoje está com anéis, mas nem sempre foi assim.

Este cacimbão tem uma relação muito íntima com as famílias da Carqueija, tanto da Carqueija dos Alves, como a Carqueija Diocese e a Carqueija São Mateus. Isso porque socorreu as famílias locais nos períodos de estiagem. E foram muitos.

Segundo apuramos este cacimbão teria sido marcado, indicado por um padre. Uns dizem que foi o Pe. Cícero São Cícero de Juazeiro outros não chegam a afirmar que padre foi. Como o proprietário do local era uma pessoa muito católica, o Sr. Pierre Aon, de quem já falamos em outros trabalhos, é razoável acreditar que tenha sido realmente a indicação de um padre pois muitos deles tinham conhecimento de hidrologia e geologia geografia, o que certamente influenciou nesta indicação. Mas, seja como for o importante é registrar a importância do cacimbão de São Francisco para toda essa gente.

Segundo o meu irmão Sassá, que botou muita água de lá em 1958, ano de uma grande seca, a pessoa que cuidava do Cacimbão, Sr. Antônio Terto, que morava bem pertinho do mesmo, cuidava com todo carinho do Cacimbão. Tinha um flandre e uma vassoura de relógio (mato que se faz vassoura de terreiro) e todas as tardes ele limpava as fezes dos jumentos que as pessoas traziam para levar água.

O Cacimbão era aberto, tinha uma escadaria que a gente descia até embaixo, para colher a água. Ainda segundo segundo Sassá, o local da água era uma área de uns três metros, dentro da pedra. Tinha umas duas veias d'água, que jorravam água até o nível do lençol freático. Quando tinha muita gente tirando água, nos períodos de seca, faltava água, por alguns minutos,  as pessoas esperavam que acumulasse um volume suficiente para se encher uma cuia e encher os recipientes: latas de querosene, latas de banha, cabaças canecas de madeira, potes pequenos e outros utensílios par colheita da água.

Anos atrás foi feita uma reforma no Cacimbão, foram colocados anéis e fechado a parte das escadarias do seu entorno. Mas até hoje continua com muita água, o que mostra que quem marcou o local daquele Cacimbão, tinha muita experiência neste ofício.

Viva o Cacimbão de São Francisco, que beneficiou tantas famílias e animais, nos momentos mais difíceis de suas vidas, nos períodos de seca.

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